Equilibrio financeiro

 Quem já não sentiu preocupação quando o final do mês chega e é hora de fazer as contas para honrar as dívidas? Ou então, ouviu algum conhecido dizer que está com a “mão na cabeça”, porque gastou mais do que devia e comprou algo supérfluo? Seja no primeiro ou no segundo caso, muitas pessoas encontram dificuldades para manter o equilíbrio financeiro, ou seja, gastar apenas o que realmente está dentro de sua realidade econômica.
Quando isso ocorre, a preocupação com as dívidas não fica apenas restrita ao ambiente familiar e muitos profissionais, mesmo sem perceber, acabam por deixar os problemas financeiros caminharem para dentro do ambiente de trabalho. O resultado é que o desempenho dessas pessoas termina sendo prejudicado, pois mesmo presentes fisicamente na empresa não conseguem deixar de lado as preocupações com os compromissos que podem ir desde um empréstimo para a aquisição de um carro ou até à quitação de parcelas da casa própria. Não importa o “tamanho” da dívida que foi contraída, a preocupação vai estar voltada para a questão: como vou conseguir pagar o que devo?
Para que os funcionários apresentem um melhor desempenho e não deixem os problemas financeiros tornarem-se um “fantasma”, muitas empresas investem na educação financeira dos colaboradores, através da contratação de especialistas que podem dar boas orientações para quem está no “vermelho”. Em entrevista concedida ao RH.com.br, Altemir Carlos Farinhas – consultor financeiro, administrador de empresas, pós-graduado em Finanças pela SPEI e autor do livro “Cura! Há Solução Para Sua Vida Financeira”, apresenta soluções para “salvar” os endividados e explica como as organizações podem auxiliar os colaboradores a se reeducarem financeiramente. “Acredito que o grau de endividamento dos colaboradores seja o maior já registrado no Brasil”, alerta. A entrevista na íntegra segue abaixo e é toda sua. Boa leitura!
RH.COM.BR - Há quem afirme que ao chegar ao trabalho, consegue deixar de lado preocupações pessoais como, por exemplo, o acúmulo de dívidas. O Sr. acredita que isso é possível?
Altemir Carlos Farinhas - É ilusão dizer que as pessoas não levam os problemas de casa para o trabalho e vice-versa. A não ser que tenham criado um micro chip que uma vez instalado no cérebro regule o hipotálamo e o sistema límbico do trabalhador, impedindo qualquer comportamento emocional. Vamos utilizar como exemplo o medo. Não existe uma pessoa que não tenha medo, todos têm medo de alguma coisa, mas existem pessoas que dominam o medo. Assim como existem pessoas que por mais tristes, ou preocupadas não deixam transparecer suas emoções, são excelentes atores. Dívidas causam ansiedade, a ansiedade estanca o prazer de viver, fomenta a irritabilidade, estimula a angústia e gera um universo de doenças. Tensão emocional, aperto no tórax, cefaléias, dores musculares, fadiga excessiva, sono perturbado, transtornos alimentares, entre outras reações.

RH - A performance de uma pessoa com problemas financeiros geralmente é diferenciada daqueles profissionais que possuem as finanças equilibradas?
Altemir Carlos Farinhas - É fato que não ocupamos nem 10% da nossa capacidade mental. Problemas financeiros ocupam tanto espaço em nossa mente, que prejudicam a concentração e o raciocínio, impedindo qualquer planejamento e reação. Uma pessoa equilibrada financeiramente desenvolve facilmente os seus projetos, e é muito participativa em reuniões de trabalho. Já a pessoa com problemas financeiros, é um mero coadjuvante, seu corpo está na sala de reuniões, sua mente está lutando contra taxas de juros, cartão de crédito, empréstimos e contas a pagar.

RH - Existe alguma fórmula que permita o indivíduo saber se suas finanças estão no vermelho?
Altemir Carlos Farinhas - A pessoa precisa fazer o O.F.F. - Orçamento Financeiro Familiar -, que nada mais é do que escrever todas as suas receitas e as suas despesas. A conta final é simples: receitas menos despesas, caso o resultado seja negativo a pessoa está gastando mais do que ganha. Se o resultado for zero a pessoa gasta tudo o que ganha. E se o resultado for positivo, bom sinal. Sobram recursos para investir. Outra conta que deve ser feita é o I.ET. - Índice de Endividamento Total. Total das dívidas dividido pela receita líquida multiplicado por 100 é igual ao I.E.T. Por exemplo: 350 reais divididos por 1.000 reais vezes 100 é igual a 35%. O indivíduo comprometeu 35% dos seus ganhos e qualquer número acima de 30% é muito preocupante.

RH - Que fatores mais influenciam o domínio do dinheiro sobre uma pessoa?
Altemir Carlos Farinhas - No mercado financeiro entendemos que dois fatores influenciam, um é o medo e o outro a ganância. O medo impede a pessoa de crescer financeiramente. Por exemplo: o rico joga para vencer, o pobre para não perder. A ganância afeta muito mais o rico, que é capaz de apostar alto e perder tudo. Como podemos observar essas duas forças contrárias determinam o domínio do dinheiro sobre uma pessoa. Dinheiro não tem sentimento. Quando os desejos superam as necessidades, a pessoa age irracionalmente e gasta mais do que ganha. Em muitos casos entra o que eu chamo de “Lei do Merecimento”, por alguma situação adversa - briga com marido, namorado, patrão - o indivíduo sai às compras, e para compensar, presenteia-se.

RH - Por que tantas organizações têm investimento na reeducação financeira dos colaboradores?
Altemir Carlos Farinhas - Acredito que o grau de endividamento dos colaboradores seja o maior já registrado no Brasil. Essa hipótese não é vista pelo volume de contas em atraso ou indicadores da Serasa, Seproc e outros. Faço essa conjetura com base no número de empréstimos consignados, compras de automóveis com prestações de até 96 meses, volume de cheque especial e cartões de crédito. Grandes empresas observam o volume de funcionários que vêm solicitando adiantamento de férias e até demissão para conseguirem recursos e fazerem frente a tantas dívidas. Um ótimo exemplo é a COPEL - Companhia Paranaense de Energia Elétrica. A empresa oferece palestras sobre educação financeira, o que cria junto aos colaboradores o reconhecimento e o estímulo para a reeducação financeira. Com esse reconhecimento oferece cursos onde o assunto é tratado de forma detalhada, obtendo-se melhores resultados. A empresa inseriu o tema no PPA - Programa de Pré-Aposentadoria -, e na SIPAT.

RH - De forma prática como a educação financeira deve ser disseminada no ambiente corporativo e qual o papel do profissional de RH nesse processo?
Altemir Carlos Farinhas - Primeiro é preciso conquistar a atenção do colaborador para o tema. A palestra é apenas o começo da caminhada rumo à reeducação financeira. Acreditamos que a melhor maneira de se aprender sobre educação financeira pessoal, é transmitir esse assunto tão sério de forma descontraída, dinâmica e prática. O objetivo final é que cada participante seja capaz de buscar uma vida melhor. O segundo passo é proporcionar um curso de educação financeira pessoal, onde o assunto será tratado com maior profundidade. É durante o curso que a pessoa vivencia seus problemas em relação ao dinheiro, observa que o problema não é somente seu, que apenas muda de endereço, que não é uma questão de cultura ou salário, mas sim de hábitos e atitudes corretas. Com essas ferramentas proporcionam-se estímulos e instrumentos, para que as pessoas melhorem seus hábitos financeiros.

RH - É importante que a educação financeira deva ser extensiva aos familiares do colaborador com problemas de endividamento?
Altemir Carlos Farinhas - Parabéns pela pergunta. Essa é a visão correta do problema. Ë necessário encontrar a fonte, pois quando conhecemos a causa, elimina-se o efeito. Muitas vezes o problema está no sistema, na família, e quando todos participam é mais fácil detectar as fraquezas e encontrar as forças necessárias para o equilíbrio financeiro.

RH - Existe uma crença de que as pessoas que ganham salários mais baixos são as mais endividadas. Isso corresponde à realidade?
Altemir Carlos Farinhas - Não é bem assim. As pessoas com salários mais baixos assumem vários compromissos financeiros, movidos pelo marketing, pela facilidade de crédito, por diversos apelos. Um dado importante é que muitas assumem compromissos que podem pagar, e com isso conseguem mobiliar a casa, comprar eletrodomésticos, computadores e outros produtos que antes eram apenas um sonho. Em muitos casos o erro das pessoas que ganham pouco é fazerem a conta do “CABE”. Eu ganho 800 reais uma prestação de “oitentão” cabe. Só que 80 reais equivalem a 10% do salário, não é o quanto “cabe” é o quanto eu posso. E isso a pessoa só fica sabendo depois de fazer Orçamento Financeiro Familiar. A classe média é quem vai pagar a conta. Em sua maioria não aceita uma queda no padrão de vida, procuram manter uma vida de aparência e com isso alimentam o monstro do endividamento. As pessoas compram o que não precisam, com o dinheiro que não possuem para agradarem pessoas que nem ao menos gostam.

RH - Quem recebe um salário alto se sente tentado a gastar mais e contrair, conseqüentemente, dívidas preocupantes?
Altemir Carlos Farinhas - É a pirâmide de Maslow, assim que uma necessidade é suprida aparece outra. Infelizmente o ser humano é altamente influenciável, e quando ganha mais começa a viver em outra esfera, outro grupo de pessoas, outro padrão de vida. Se a pessoa não aprendeu com seus erros, está fadada a comprometer o novo salário e mais um pouco.

RH - Algumas organizações oferecem linhas de crédito, com desconto na folha de pagamento. Essa é uma boa alternativa para tirar os funcionários do pesadelo das dívidas?
Altemir Carlos Farinhas - Observando o lado prático e técnico, é uma boa alternativa. Juros mais baixos que os praticado no mercado, facilidade para obter o empréstimo e para o lado do credor a garantia que irá receber. Porém, costumo reforçar em meus cursos que “a facilidade aprisiona” ou “cavar um buraco para tapar outro não resolve”. O profissional de RH deve proporcionar palestras ou cursos antes de oferecer essa alternativa. É necessário que o indivíduo primeiro faça um planejamento financeiro, para saber o quanto pode assumir de prestação e negociar melhor o pagamento de suas dívidas. Na maioria das vezes, os empréstimos consignados não são bem conduzidos e o pesadelo das dívidas aumenta e a cada mês o funcionário ao receber o “CHOLERITE”, fica insatisfeito com a empresa e não com a financeira.

RH - Que orientações o Sr. daria a uma pessoa que acumulou dívidas que fugiram ao controle?
Altemir Carlos Farinhas - Procure manter a calma, nada que é feito em momento de nervosismo ou por impulso trará bons frutos. Quem deve ficar sem dormir, nervoso, irritado, preocupado mesmo é o credor, pois quer receber o seu dinheiro de volta.
Regra número 1: faça junto com a família o Orçamento Financeiro Familiar. Despesas ruins devem ser cortadas e as demais reduzidas.
Regra número 2: relacione todas as suas dívidas, taxas, prazos, prestações, saldo devedor. E escreva um histórico da compra, o motivo que o fez assumir essa dívida.
Regra número 3: negocie sempre, mas sempre, em primeiro lugar com o seu credor. Não havendo acordo procure financiamentos com taxas de juros mais baixas e mude o perfil de sua dívida, seja alongando o prazo ou reduzindo o saldo devedor. Anote tudo, nome da pessoa com quem você está falando, número de protocolo, qual foi a sua proposta, qual a proposta do credor.
Regra número 4: saiba que você pode. Nenhum problema é maior que você ou sua família. Se o problema é muito grande, vai demorar um pouco mais de tempo, mas você resolve. Busque em você algumas soluções, vender o carro, televisão, fazer dinheiro com alguma coisa que você pode abrir mão. Não é vergonha retroceder para depois avançar.
Regra número 5: para não se endividar e evitar compras desnecessárias faça três simples perguntas - Eu quero? Eu posso? Eu preciso?

 

 

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